Ultimamente quando falamos em coronavírus, pandemia e quarentena, já estamos falando de coisas do passado, assuntos antigos que felizmente não permeiam mais 24 horas dos nossos dias, porém, será que esses assuntos ficaram tão no passado assim?

Enquanto as medidas de segurança e saúde se abrandam, as taxas de mortalidade caem e a vida volta ao seu formato presencial e aglomerado comum de outrora, algumas coisas não se reestabelecem tão facilmente assim.

Não é surpresa para ninguém que as medidas de segurança determinadas durante a pandemia mudaram completamente nossas rotinas, principalmente a quarentena. Os longos dias de isolamento e a atmosfera de medo perpetuada durante este período, embora objetivasse alertar e proteger, deixou algumas “sequelas”.

Portanto, ainda que tenhamos regressado ao tão sonhado “normal”, este não é mais exatamente o mesmo que conhecíamos. Além da mudança óbvia de pensamento e comportamento das pessoas, de tendências na sociedade, de interesses e o aumento completo da presença digital no nosso dia a dia, que estão aos poucos reescrevendo o convívio social, também é possível observar mudanças mais pessoais.

 

Sobrecarregando o sistema

O estado de alerta constante e privação social desencadeou uma série de comportamentos prejudiciais para maioria das pessoas, abolindo práticas importantes nas suas vidas e afetando suas relações com todo tipo de atividade. Por exemplo, quem possuía uma rotina muito ativa fora de casa, com idas a academia, trabalho presencial, encontros sociais e outras atividades externas, se viu confinado a um espaço muito menor e precisou redirecionar toda essa energia, e agora, mesmo com a liberação deste confinamento, o corpo e a mente encontram dificuldades em reestabelecer o ritmo original.

De uma certa forma, nós sobrecarregamos o nosso cérebro com estresse, excesso de atividades simultâneas (domésticas e profissionais), ansiedade e uma certa desorientação geral, e não satisfeitos, fizemos deste cenário caótico um costume, por um longo período de tempo, deixando este órgão completamente exausto. E por fim, ainda mudamos tudo completamente de uma hora para outra, confundindo mais ainda o coitado.

Nessa enxurrada de exigências no nosso dia a dia, temos mentes sempre ocupadas, e acabamos esbarrando em um fenômeno que pode ser conhecido como epidemia da ocupação, onde as pessoas se jogam em um esforço louco para serem o mais produtivas possível. Essas pessoas tentam dar conta de tudo de uma vez só, e pior ainda, se mantém ligadas a todas essas demandas do dia a dia o tempo todo, sem folga e sem um foco específico. Logo, se pensarmos com carinho em todas as atividades que podem exigir nossa atenção em um dia, e considerarmos este cenário onde corremos para atender a todas elas, podemos facilmente concluir que esta conta não fecha e que é impossível sair satisfeito dessa empreitada. E a pior desse comportamento é que mesmo que seja impossível, algumas pessoas vivem essa realidade de dedicação absoluta às custas de sua própria saúde e eventualmente esta prática acaba cobrando seu preço.

Sendo assim, não é de se espantar que diversas pessoas tenham relatado em reportagens uma dificuldade perceptível ao lidar com tarefas que exigem foco e concentração ou ainda que tem tido sensações de inassertividade e inadequação após o abrandamento da pandemia. Tais relatos se tornaram tão frequentes e comuns que geraram até mesmo uma nomenclatura para o problema: cérebro pandêmico.

Mas é importante salientar que não se trata de um distúrbio ou doença em si, e sim uma consequência das mudanças vividas por este órgão do sistema nervoso durante os últimos anos, o que não torna esta dificuldade menos digna de atenção.

Anthony Wheeler, reitor da Escola de Administração Widener University, professor de administração e especialista em burnout (esgotamento psicológico de funcionários), afirmou em entrevista ao The Washington Post, que as pessoas que têm relatado estes problemas de concentração não estão apenas distraídas, elas estão perdendo os recursos psicológicos, sociais e emocionais que nós usamos para cumprir nossas demandas diárias.

Além disso, ainda considerando os dados levantados pelo The Washington Post, Robert Desimone, professor de ciências cognitivas e diretor do Instituto McGovern para Pesquisa do Cérebro no MIT, disse que, independentemente de suas distrações serem físicas ou psicológicas, elas podem interferir com a sua habilidade cerebral de focar. Logo, quando você mistura fatores de estresse com prazos, cobranças e pressão externa, você cria um ambiente repleto de distrações psicológicas para o seu cérebro decifrar e filtrar, que resulta fatalmente em uma redução significativa da sua capacidade intelectual para realizar qualquer tarefa.

Resumindo, ao tentar fazer múltiplas atividades ao mesmo tempo, nenhuma delas será bem executada. E foi exatamente este caráter de excesso de demandas que a pandemia trouxe para nós. Além da preocupação constante com saúde e segurança, ocorreu uma fusão entre vida doméstica e profissional que acabou por obrigar um certo tipo de multifuncionalidade que intercalasse tarefas de casa e do trabalho, sobrando muito pouco tempo para descanso, principalmente para aqueles com crianças pequenas em casa.

 

Como sair dessa?

A longa duração deste cenário criado pelo período de pandemia educou o nosso cérebro dessa forma confusa e desorientada, mas da mesma forma que ele aprendeu estes hábitos indesejados, ele pode aprender novos hábitos. Ou seja, precisamos reeducar o nosso cérebro para obter dele resultados mais satisfatórios no nosso desempenho diário. E para realizar este processo de reeducação, existe um conjunto de ações que podem fazer uma grande diferença.

1 Dormir bem é essencial, não ter uma quantidade adequada de sono tem consequências enormes no seu sistema e afeta absolutamente tudo, do seu humor a sua capacidade cognitiva e habilidade de concentração. Portanto estabeleça uma rotina de sono saudável, como horários semelhantes todos os dias e uma quantidade mínima de horas para descansar seu corpo e sua mente.

2 Exercícios físicos são fortes aliados no bem-estar geral do seu corpo e liberam substâncias muito necessárias para o bom funcionamento do nosso cérebro, sem falar que uma rotina de exercícios contribui para melhores noites de sono e promovem mais disposição.

3 Dê pausas, relaxe a sua mente, não só nos seus dias de folga como durante as suas horas de trabalho. Durante o seu dia desvie o olhar das telas por alguns minutos, levante, alongue-se e então retorne, para evitar a fadiga e o cansaço extremo. E durante seus dias de folga evite ao máximo realizar tarefas relacionadas a trabalho, se permita realmente ter um tempo para você e busque realizar atividades prazerosas, que estimulem a sensação de recarregar suas energias.

4 Dedique-se a apenas uma tarefa por vez, elimine os hábitos de multitarefa e pratique o foco direcionado e específico a apenas uma demanda de cada vez, dessa forma você aumenta sua concentração e sua produtividade.

5 Reduza o tempo nas redes sociais e afaste-se um pouco do comportamento hiper vigilante, onde toda notificação tem que ser lida imediatamente. Separe momentos específicos para essas práticas no seu dia, isso evita que seu cérebro fique ansioso e sobrecarregado com a iminência dessas distrações, que são grandes culpadas pela perda de foco.

Essas soluções podem não ser fáceis ou simples de implementar para todo mundo, afinal os mesmos estresses e acúmulo de demandas que tornam difícil trabalhar, também tornam difícil a implementação de mudanças de hábitos. Mas estudos apontam que incorporar ao menos duas dessas práticas na sua rotina pode gerar um impacto significativo, afinal o seu cérebro é um órgão biológico e o estímulo causado por essas ações é exatamente o que o torna melhor, aprimorado e mais eficiente.

 

O que o RH pode fazer?

É claro que essas dificuldades cognitivas devem ser superadas pelo próprio indivíduo, porém o profissional de RH pode agir como conscientizador desses desafios dentro do seu ambiente corporativo e incentivar as práticas que atuam como ferramentas de reabilitação para o cérebro.

Uma vez que o profissional vê suas angústias reconhecidas pela empresa onde atua, ele experiencia acolhimento e sente mais segurança para relatar suas dificuldades e até mesmo para desempenhar suas funções. Também, é provável que ouça e absorva essas dicas para saúde cerebral de forma mais séria e busque desempenhá-las.

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